Já está no ar minha crônica de dezembro de 23 no blog Tesão Literário, no portal pernambucano Ver Agora.
Na Lego Ergo Sum deste mês, falo sobre o ato de escrever, a partir de poema do saudoso e genial Paulo Leminksi.
Confira!
(Ah, e aproveite para ler as colunas anteriores):
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É, pode ser
Por Ricardo Mituti
Um dia, durante um almoço, me perguntaram qual era meu sonho. Disse que era viver da escrita. Depois, me perguntaram qual seria o ápice desse sonho. E eu respondi que seria ganhar o Jabuti – o mais tradicional prêmio literário do Brasil. Em seguida, pediram para eu descrever a cena da premiação e até ensaiar algumas palavras do discurso de agradecimento. Entrei na brincadeira e o fiz, não sem alguma empolgação, confesso.
Confesso, também, me chatear com o fato de minha carreira de escritor ainda não ter engrenado. E olhe que eu nem estou falando de Jabuti. Lamento não conseguir pagar meus boletos com as linhas que rabisco e os versos que ouso criar.
Ah, mas você já escreveu alguns livros, teve poesias premiadas e publicadas em revistas e antologias. É preciso paciência e persistência. Uma hora sua hora chega. É, pode ser. Mas, e se não chegar? E se eu passar o resto da minha existência escrevendo e, com esse trabalho, não conseguir sequer pagar a conta do gás? Jabuti, então, só mesmo o que fantasiei naquele almoço.
Ah, Ricardo, mas são raríssimos os casos de autores e autoras que vivem apenas do que escrevem. A maioria ainda precisa ter carreiras paralelas para sobreviver. Infelizmente, no Brasil, a literatura não é valorizada como deveria. É, pode ser. Mas então isso significa que aquela história de buscar seus sonhos, de que tudo é possível, de foco na meta é só papo de coach? Que eu tenho de aceitar a realidade dos fatos e escrever por amor, apaixonado que sou pelo ofício? É, pode ser.
O multitalentoso Paulo Leminski, poeta curitibano morto precocemente no final dos anos 80, nunca ganhou um Jabuti em vida – justiça seja feita, em 1995, seu livro “Metamorfose: uma viagem pelo imaginário grego” ficou com o terceiro lugar na categoria Poesia. Mas nem por isso ele deixou de ser relevante para a produção cultural do País; muito pelo contrário.
Ah, mas você está se comparando ao Leminski? Jamais! Leminski era genial, e eu estou bem longe disso. Aliás, Leminski não era só genial; era, também, um sábio. Em todos os sentidos. Inclusive – ou seria sobretudo? –, no que diz respeito à arte da escrita.
Escreveu ele em “Razão de Ser”, publicado no livro “Toda Poesia”: Escrevo. E pronto. / Escrevo porque preciso, / preciso porque estou tonto. / Ninguém tem nada com isso, / Escrevo porque amanhece, / e as estrelas lá no céu / lembram letras no papel, / quando o poema me anoitece. / A aranha tece teias. / O peixe beija e morde o que vê. / Eu escrevo apenas. / Tem que ter por quê?
Título e fecho do poema já dizem tudo: escrever é a razão de ser do poeta – como o é para mim, registre-se –, e ele apenas escreve, sem ter um porquê.
Pelo bigode de Leminski! Mas… escrever por escrever? Apenas? Sem Jabuti, sem discurso, sem contrapartida financeira, sem nada? É, vá lá. Pode ser.